Outro dia estava com meu amigo Palhaço Bonito participando do nosso projeto de visitas virtuais aos hospitais, chamado, “to te esperando na janela”, e em meio a toda a onda que rolou por ali, vi-me propondo, ao nosso hóspede, contar uma piada, uma piada boa. Eita nóis, promessa é dívida. Se disse que a piada ia ser boa, me lasquei, então eu teria que cumprir. Cão que ladra não morde. Daí pronto. Já sei, vou contar uma piada daquelas de nacionalidades, essas bem preconceituosos que sempre dão certo, ou ofendem alguém, ah, como era mesmo, tinha um alemão, um chinês, um brasileiro, não não, tinha um português, um javanês… Não sei. Mas eram três, e acharam uma lâmpada. Mas lâmpada não tem gênio. Não sei da onde que tiraram essa ideia, esfregar a lâmpada pra sair gênio. Eu já ouvi a expressão “estar girando lâmpada”, mas esfregando, nunca. Quer dizer, já ouvi, mas nunca vi dar resultado. No máximo acredito que se você esfregar uma lâmpada ela vai esquentar, ficar lustrosa, mais brilhante. Perigoso. É melhor tirar do soquete antes de esfregar, pois você pode tomar um choque, dar um curto, um longo, sei lá. Mesma coisa quando a ideia é boa, dizem, idéia genial, daí acende uma lâmpada, se for uma ilustração de gibi. De novo, nada a ver, gênio não sai de lâmpada de bulbo! Propaganda enganosa. Então, na minha história não tem gênio da lâmpada. Os três acharam uma sereia, aí sim. Uma sereia. Daí, a sereia disse que eles tinham três desejos. Mas um deles pensou, três desejos pra cada um, ou três desejos pra dividir entre nós? Se for só três desejos pra todo mundo, não é desejo, é recessão. Mas ninguém perguntou, com medo da resposta. Daí, o iugoslavo disse que queria ser o primeiro, pra não dar briga. De fato, tem gente que prefere ficar por último pra ouvir os desejos dos outros e não pedir repetido, mas tem gente que é ansioso e prefere pedir antes, pra se livrar do ônus da escolha logo, e não ficar sofrendo com a decisão. Tem gente que é nem lá nem cá, e fica de boa em qualquer posição. Pra esses nem sei se precisariam ser premiados com um desejo, já que pra eles não fede nem cheira. É o que a gente chama de gente “em cima do muro”, a turma dos “deixa disso”, dos panos quentes. Mas não era uma história de desentendimento e briga, até porque poderia desencapar uma terceira ou quarta guerra mundial, visto que alí tinha um americano, um russo e um chinês. E quantas sereias precisa pra trocar uma lâmpada? Depende, se for lâmpada do gênio, é mais pesada, mas não existe, aí como é que fica? Não fica, porque se não existe, não tem; e se não tem, faltou; e se faltou leva bomba. Daí fica perigoso de novo, bomba em campo minado. Mas minha história não é sobre guerra, como disse, muito menos desentendimentos. Mesmo insistindo nisso, parece que não alcancei muitos efeitos cômicos, pois mesmo dizendo que não queria desentendimentos, ninguém parecia entender nada, nem o paquistanês, nem o chileno, nem o iraniano. Seria mais fácil se não fossem três nacionalidades, mas os três porquinhos, Huguinho, Zezinho e Luizinho, porque daí todo mundo já conhece a história, o lance do lobo, e me concentraria nos filigranas da narrativa, dando um tom mais colorido, uma floreada aqui, outra alí, quase virando uma história de contos de fadas, o que não tem muita graça. Então, visto que ia perder a graça, abortei a ideia dos três porquinhos, segui com os desejos. Mas eu não lembrava muito bem como era a parte em que o mineiro pedia queijo, ou pão de queijo, goiabada, fiquei com fome. Comecei a embaralhar um pouco a história, porque saco vazio não pára em pé. Talvez porque saco nem perna tenha. Não tava mais ligando nada com nada. Me perdi total, e pensei que eu poderia sugerir ao carioca, ou ao paulista, que na vez deles, invés de pedir um desejo material, que pudessem pedir uma piada genial (ah, olha a brincadeira
autorreferencial….)! Isso, daí eu me livrava da responsabilidade de eu tirar da cartola uma piada engraçada de verdade e contava com a piada que surgisse da própria piada, como se a coisa se sustentasse por si só, o saco vazio levantando, ficando em pé e seguindo sua vida. E no caminho, enquanto voa por aí, vai deixando um rastro de alegria que até faz a gente esquecer um pouco das agruras da vida, mesmo com o saco cheio.
Palhaço Pelúcia.