No trabalho de palhaços em hospitais que desenvolvemos na Trupe da Saúde, por vezes, nos deparamos com situações muito difíceis. Os hospitais são estruturas destinadas à cura. No entanto, o conhecimento e a intervenção humana ainda não podem garantir a superação de todos os males que interrompem a vida. Estar nos hospitais, portanto, é estar em contato constante tanto com a evolução e o sucesso de processos de cura, quanto com o agravamento e a morte de pessoas.
A figura do palhaço, de modo geral, está associada à alegria. No entanto, assim como os médicos com relação à saúde, nós, palhaços, não possuímos a garantia do sucesso, o que é profundamente frustrante: a sensação de impotência pode desorientar, paralisar.
Em uma das visitas que fizemos ao Hospital Erasto Gaertner deparei-me com uma destas situações difíceis. Depois de visitar todos quartos de enfermaria a que nos havíamos proposto, saímos do hospital em direção ao estacionamento para ir embora. Eu estava me sentindo bem pois nosso trabalho foi exitoso, com momentos de extravasamento. Até dancei funk com uma senhora que acompanhava uma paciente!
Ali, no estacionamento, avistei uma mulher que carregava uma mala. Ela poderia ser um médica, uma funcionária ou uma paciente, não podia imaginar. Ali fui eu, palhaço solícito, oferecer-me para ajudar a carregar sua mala. Ela aceitou, e eu segui falando bobagens. Enquanto perguntava sobre o conteúdo da mala e até onde iríamos, pouco a pouco, a mulher ia revelando.
A mala era uma mala de roupas sujas de uma paciente, sua mãe. Levamos a mala até um carro e a deixamos no porta-malas. Em meio às bobagens que falávamos, seus olhos começaram a lacrimejar. A tristeza era evidente. Em silêncio, abraceia-a e ela chorou. Falamos um pouco da necessidade de extravasar, de não ter que ser sempre forte. Nos despedimos dali um pouco. Ela ia à lanchonete do hospital, e eu embora.
Eu poderia pensar que não soube o que fazer, ou que o que senti naquele momento não estava à altura da tristeza que ela experimentava. No entanto, acredito que tenha sido positivo não ter me emocionado tanto, que, do estado de espírito em que me encontrava, pude apoiá-la em sua tristeza. Talvez ela precisasse de alguém para quem pudesse demonstrar o que escondia de sua mãe ao dar-lhe suporte.
Antes de escrever este texto assistia um vídeo de uma palestra sobre compaixão. Dentre as inúmeras reflexões que a palestrante teceu, citarei uma: “É preciso ter as costas fortes e a frente suave. É necessária uma força tremenda nas costas para se sustentar em meio às condições (adversas). E esta é a qualidade mental da equanimidade. Mas também é preciso ter a frente suave – a capacidade de estar realmente aberto ao mundo como ele é, de ter o coração não defendido”.
Bruno Mancuso Dr. Pelúcia