Antes de tudo gostaria de dizer que essa história não é real…
mas poderia ser…
Em uma família comum um bebê está para chegar, logo aparecem também as primeiras roupinhas, toalhas, cobertores, lencinhos, pacotes e mais pacotes de fraldas. O guarda-roupa fica pequeno e já não acomoda as peças da família… alguém precisa se mudar!! é aí que eu entro em cena:
Logo pela manhã, após ter comparado preços pela cidade eles me encontraram entre tantos outros móveis, numa loja de móveis em uma rua cheia de lojas de móveis, móveismentado não? não sei por qual motivo me escolheram: se teria sido pelo espaço ou se eu combinava com os demais móveis da casa ou então foi o preço, mais ajustado à realidade da família naquele momento, não importa… lá fui eu!
Minha primeira viagem foi um tanto movimentada, o transporte não era assim tão grande e tive que me apertar, escutava eles dizendo: “- a porta não está fechando!”, “- vira… não… deita ela…”, “- tira as gavetas e os pés que voltamos a buscar depois!”, aperta aqui, aperta alí, passa fita nas gavetas para não correr, tira um pezinho que ficou pegando o vidro e fomos.
Sabem, essa história realmente não é real, mas bem que poderia ser!
Chegando em minha nova morada ganhei destaque no corredor, uma parede que ainda tinha cheiro de tinta fresca, obviamente pintada para me esperar, podia ver e ouvir pelo chorinho no quarto que eu não era a única novata na casa. Talvez vocês estejam pensando que fiquei com a missão de guardar as roupas da neném, não é? mas fiquei com as roupas do pai dela, que eu chego a pensar que caberiam numa mochila de tão pouca coisa que tinha. Na casa tinha um cachorro também que insistia em fazer xixi em um dos meus quatro pés.
Entre choros e xixis, fraldas e roupas o tempo foi passando e a neném aprendeu a andar, se segurando pelos móveis da casa que orgulhosamente uma deles era eu! Porém, um dia a mãe da neném chegou em casa, pálida com ar apreensivo, eu sabia que ela já andava meio mal, pois as vezes eu aparava alguns remédios para aliviar enjoo, mas não imaginava o que poderia ser, então ela contou para o pai da neném o que estava acontecendo, eles ficaram muito felizes, mas só descobri o que era quando eles deixaram o exame sobre mim e se abraçaram, então pude ver o resultado: a família ia crescer novamente!
Pensava: onde eles colocariam as novas roupinhas, toalhas, cobertores e… tudo? Dessa vez mudamos de casa, a casa antiga parecia pequena para duas neném é verdade. Agora sim, casa nova, um quarto a mais só pra mim e… ué… quem é o grandão aí? um armário? inteiro, só para as crianças? e as roupas do pai das nenéns que voltaram para o armário do casal, será que eles iriam me dispensar?
Enquanto esperava o momento derradeiro de minha partida pensava em tudo que vivi com eles… que agora eu não guardava mais as roupas… que… espera aí… agora tudo estava mais colorido, lápis de cor, folhas de sulfite, giz de cera, um brinquedo ou outro, livros de historinha, quanta coisa! Cacarecos, documentos, cofrinho das crianças, máscaras… Máscara? Álcool em gel? o que tá acontecendo?
Eles mudaram mesmo! o pai das nenéns e elas já não saíam tanto, a rotina da casa que sempre fora agitada estava mais calma, os lápis de cor e brinquedos ganharam mais atividade nesse momento, inclusive minhas gavetas ganharam algumas cores, principalmente as que estavam mais perto das mãozinhas da neném mais nova.
Outro ano se passou e pela tv eu escutava notícias tristes e também algumas esperançosas de tempos melhores, entre os cacarecos sobre mim estavam sempre alguns papéis como a carteirinha de vacinação das nenéns, um carimbo do zé gotinha que a neném mais velha se orgulhava de mostrar para todo mundo. Um dia depois uma gripezinha acometeu a todos na casa, mas talvez pelo efeito da própria vacina as nenéns e o pai delas logo melhoraram, porém a mãe das nenéns seguiu com sintomas, dores e enjoos… enjoos? outra vez??
Não demorou muito para que outro teste viesse sobre mim e novamente o resultado era o mesmo! outra neném vem aí!! e agora? novas roupinhas, toalhas, cobertores, lencinhos, pacotes e mais pacotes de fraldas… não podia ser verdade…. e não era… já que essa história não é real…
mas poderia ser!
Pra resumir a história eu sigo aqui, parece que as roupas do papai voltarão a ocupar minhas gavetas enquanto vou continuando e seguindo em família: dos pais talvez passarei para alguma filha e então alguma neta me herdará… e quem sabe “com um puxador a menos e as gavetas tortas” eu, a cômoda, estarei cômoda olhando ela fazer suas video-chamadas, enquanto escuto o chiado dos seus vinis riscados. Ah! essa parte da história poderia não ser real… mas é!
A cômoda do Abelardo Biloba