O quarto ficava no 15o andar.
Seu tesouro era a janela. De lá podia se ver, enquadrada como moldura, grande parte da
cidade e também as montanhas. Sim, uma cadeia de montanhas e possivelmente a serra do
mar despontavam no horizonte. Era uma vista e tanto aos olhos do solitário homem que
ocupava a cama próxima à janela.
Entramos para ver o imóvel. “Este é o quarto do qual lhe falei…” disse eu ao meu parceiro e
possível inquilino. “Gostou da vista?”, insisti. Na moldura dos olhos dele habitavam a cama, o
homem, a janela e a vista da cidade com montanhas ao fundo. Um quadro totalmente novo,
distinto, eu pensei.
Meu parceiro concordou com um sinal de cabeça a minha indagação, e se dirigiu ao homem
chovendo perguntas sobre o dito imóvel. “É suíte? Possui serviço de quarto? Dá para ver o
mar?” ao que homem respondia afirmativamente.
Sanadas todas as dúvidas, decidimos fechar negócio.
Falamos sobre o preço e das condições especiais de pagamento em dinheiro, à vista. Quando
já íamos apertar as mãos, o homem soltou: “Mas não está para alugar.” voltando seus olhos
para a janela, para cidade, para as montanhas e o horizonte.
Calamos.
Entendemos.
As condições de pagamento haveriam de esperar por outra oportunidade. O ex-futuro
inquilino também. E a própria corretora. Era um imóvel especial, e para aquele distinto
homem, a vista emoldurada daquele quarto de hospital… seguiria a prazo.
(Escrito em algum momento de 2019 – durante as oficinas de escrita criativa ministradas pela
Gloria Kirinus com o elenco da Trupe da Saúde – e revisado em Junho de 2020).
Yara Rossatto – Palhaça Solara